Angola e Síria: 2 vídeos para ver
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"Todas as mulheres que já vi, assim que saem das zonas do Estado Islâmico, arrancam e depois atiram com esta vestimenta, como se materializassem o seu sentimento de liberdade" Jack Shahine, fotojornalista.
Cá vai. Hoje fui a um dos campos para os refugiados em Berlim.
Juntamente com duas colegas, levamos roupa, mantas, casacos, chá, etc.
Em dois minutos os meus pés já estavam gelados e em menos de dez, já tínhamos distribuído tudo o levámos.
Ficar de mãos vazias foi horrível! Quando dei por mim, já estava a dar as minhas luvas e o meu cachecol. Ninguém aceitou. Quando por fim convenci um puto (vá, um jovem - devia ter cerca de 16 anos) a ficar com o meu cachecol, ele acabou por voltar e devolver-mo. E pôs-mo ao pescoço.
Mais de 30 pessoas estavam à porta do campo, alinhadas junto ao edifício. Estavam no chão, sentadas em caixas de cartão, à chuva e ao frio (e, caramba, como faz frio em Berlim!). Aquelas pessoas iam passar ali a noite. A razão? Não tinham o número para entrar. E para terem o número precisavam de um outro número que dá acesso ao outro número!
Quando falo em pessoas, falo em homens e mulher. Adultos, jovens, adolescentes e crianças - vi duas crianças!
Do outro lado, era possível ver uma das tendas vazias - uma dessas tendas de festival, grandes de plástico. Os meus pés cheios de frio não paravam de perguntar qual a razão para não deixarem aquelas pessoas entrar e ficar na tenda. Um senhor alemão que tentava encontrar a família de um refugido, também não entendia. Os funcionários falavam-lhe das regras. Ninguém podia entrar. O alemão incrédulo só me dizia "estão cheios de merda na cabeça!" Até pode ser, mas eu tenho a certeza que também eles tinham os pés frios.
Para mim, as pessoas da fila, riam-se e apertavam-me a mão. Quando souberam que eu era Portuguesa, enumeram-me nomes de jogadores de futebol portugueses (acho!), com Cristiano Ronaldo à cabeça.
Para a minha colega, natural da Jordânia, explicavam-lhe de como se sentiam humilhados. Não eram animais para dormir na rua. Que tinham frio. Queixavam-se do futuro incerto. De como estavam arrependidos de ter vindo para a Alemanha. Que talvez na Jordânia as coisas fossem melhor.
Por que razão vos conto isso?
Não quero apontar o dedo à Alemanha, nem criticar funcionários. A razão é simples, a próxima vez que ouvirem alguém falar sobre como os refugiados são beneficiados ou de como eles têm acesso a tudo, trabalho, saúde casa; lembrem-se (e falem-lhes) deste pequeno episódio - que eu sei que não é isolado e que se repete diariamente. Recordem a essas pessoas, que um refugiado não tem escolha.
#KiyiyaVuranlnsanlik
Eu nasci em 1986 e poucos meses depois, Portugal entrava na União Europeia. Eu faço parte de uma geração, que sente ou talvez seja eu, que a Europa é também parte da minha identidade e que ser europeia, mais do que uma referência territorial, é também fazer parte deste grupo de estados-membros diversos, mas unidos entre eles.
Não é um namoro perfeito - não os há! Poderíamos estar aqui a falar de quotas, subsídios que pararam culturas agrícolas, de fábricas que fecharam, muita corrupção e dinheiro mal investido, etc., etc. Não sou naif, nem uma total desinformada.
Apesar do "somos todos amiguinhos e unidos na diversidade", não nos podemos esquecer que a base da União Europeia são os acordos económicos e de comércio livre.
O facto de estar na UE, permitiu-me viver algumas das melhores experiências da minha vida. Fiz Erasmus (e num país que não é membro), mais tarde fiz o Leonardo da Vinci (num país que tinha recentemente aderido à UE) e ainda pude viajar muito, conhecer pessoas incríveis, explorar para lá do meu umbigo, conhecer e partilhar histórias. Permitiu-me também sair do meu país e encontrar um melhor trabalho sem grandes problemas ou dramas burocráticos.
Recordo-me de há uns anos, ler uma notícia sobre o corte que ia ser dado às bolsas Erasmus e de ler um comentário contra, que alegava que são esse tipo de programas que eventualmente evitam uma terceira guerra mundial. Extremo? Sim, muito! Um pouco! Mas não deixa de ter um fundo de verdade. Todas as minhas experiências, desde as académicas, profissionais ou de lazer, permitira-me mais do que tudo conhecer pessoas. Quando pensou na Alemanha, nem o Holocausto, nem a Merkel são a minha primeira referência. Penso no meu amigo Johan a dançar salsa. E por aí fora!
Quem é que no futuro, partilhando e vivendo estas e outros experiências, poderia defender ideias nacionalistas ou apoiar qualquer tipo de conflito, que eventualmente magoaria um amigo?
Foi por tudo isto e pelo idieal romântico da UE, que nos últimos tempos, mesmo contra tudo e todos, eu ia defendendo a Europa. Não era fácil, mas nem todos os amores o são!
Apesar da figura controversa que é, doeu-me muito ver quando porque sim, tiraram Berlusconi do poder. É um tonto? É! Corrupto? De certeza! Criminoso? Não duvido! Mas no final do dia, foi nele que os italianos votaram de forma democrática. Quem são os mercados, os FMI's, as troikas ou os conselhos europeus, para mudarem isso?
Depois, veio a Grécia e a prova clara de que nesta Europa de dinheiro, o David nunca ganha.
Também há Portugal. Mesmo estando longe, dói-me ver as medidas tomadas. Uma Troika indiferente às pessoas e às suas necessidades e um governo submisso, sem respostas à altura e de fazer as mudanças necessárias - enfim, outros assuntos com pano para mangas e palavras para vários pots.
No meio de tudo isto, dei por mim a sentir que esta/aquela não era a minha Europa! Não foi para isto que me inscrevi e não foi isto que defendi!
E agora, os refugiados.
Como é que é possível que uma organização como a UE, não tenha capacidade para organizar 27 estados membros e receber de forma digna estas pessoas?
Sim, digo receber. A UE, em particular as ditas grandes potencias, tem muita responsabilidade naquilo que está acontecer com a Síria, a culpa não é todo do ISIS e mesmo que fosse, ONU, NATO, etc. onde andam vocês?
Estas pessoas entram na condição de refugiados, ou seja, não é apenas em busca de um novo trabalho (e esse seria novo tópico a merecer outro post), mas sim em busca de protecção, porque a vida corre perigo. Muitos destes refugiados já o eram na Síria.
E que anda a UE a fazer? A Europa constrói muros, impede-lhes a passagem e muitos ainda são mal-tratados e roubados pelas autoridades. Poucos se chegam à frente, não há uma solução comum... A sério, o que é isto?
Entendo que a solução não é fácil e que o tema é delicado. Mas num continente que já sofreu duas grandes guerras, entre outros conflitos e que teve os seus próprios refugiados e se caracterizou por colonizar meio mundo, onde é que está o espírito de humanidade e solidariedade? Onde é que está a empatia no meio disto?
21 pessoas vão ser acolhidas em Penela.
Se outras localidades fizessem o mesmo, multiplicando, quantas vidas Portugal poderia salvar? E a Espanha? E a França? E a Itália? E a Alemanha? Etc. etc. etc. A sério, que Europa é esta?! Como dizem os turcos, este é o naufrágio da humanidade (#KiyiyaVuranlnsanlik).
Óbvio que algo mais tem que ser feito, há um problema sério na Síria, que necessita de resposta urgente. Mas enquanto quem manda neste mundo não mete as pilhas, há gente a chegar... e a morrer! Sonhos e vidas que literalmente morrem na praia.