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Maria vai com todos

Estórias. Histórias. Pessoas. Sítios. Viagens.

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Memórias de Varsóvia - parte III

03.08.16

Como e tomo café, numa espécie de FNAC (sim, sim, eu em viagem gosto de ir a livrarias de outros países) com uma bela vista e uns sofás confortáveis. Peço um café (queimado que dói) e aproveito para acabar de ler as últimas páginas do meu companheiro português pela Polónia. Enquanto leio sobre os últimos dias de Ricardo Reis, ouço: “És portuguesa?”.

Lá estava ele, um Erasmus com muitas saudades de ouvir e falar português. E falámos muito. Saímos dali, fomos a bares e cafezinhos. Daqueles escondidos e que os viajantes gostam, mas que não estão nem nos mapas mais cools! E cerveja. E vodka. E cerveja. Falámos muito e entre um foda-se” e um “caralho” lá estou eu atrasadíssima para apanhar o autocarro de volta para Riga. E ainda tenho que ir ao hostel buscar as minhas coisas. Um abraço, sorrisos nervosos e não houve tempo para mais. Como estará o moço? O João - acho!

Na casa da avó polaca, montou-se uma festa reggae, com muita erva pelo meio. “Stay”. “Smoke”. “Dance”. “Sing”. “Don’t go”. “Stay”. E eu a ter que dizer que não. Novo abraço cheio de impulso e de verdade. Se pudesse abraçava Varsóvia, mas como não posso, agarro-me às rastas.

E agora? Agora onde apanho o autocarro? Raios-partam o meu sentido de orientação! Ela disse que sabia inglês, que estava a aprender, até me mostrou o livro. E no final termino não na Gare que me levaria a Riga, mas sim, no local (parece-me) onde estão estacionados todos os autocarros, que terminam as suas carreiras na cidade. E o tempo a passar. O motorista manda-me sair. Não fala inglês e eu desesperada mostro-lhe o meu bilhete para ir para Riga. Ele leva as mãos à cabeça. Eu levo as mãos à cabeça. E uma mãe polaca, que entretanto entrou no autocarro, leva as mãos à cabeça – aliás, levou só uma, pois a outra segurava o seu lindo bebé de cerca de três anos. O motorista põe o autocarro em marcha e pára e fala em polaco e avança. Ele pára de novo, ela levanta-se. Ela agarra-me por um braço e enfia-me noutro autocarro. Depois, pede-me o telemóvel. Eu dou, claro que dou e ela fala muito, muito. Tento brincar com a criança, mas acho que se assusta mais do que acha piada aos meus cu-cus. Voltamos a sair do autocarro e corremos muito. Pego na criança, que chora. Aliás: berra. A mulher (louca) põe-se à frente de um autocarro que pára. É quando me apercebo estamos de novo junto do hostel, mas "que raios faço eu ali outra vez! Já foi! Perdi a camioneta!" Ela tranquiliza-me e explica-me que ligou para a estação e pediu que esperassem por mim. Como? Pois, também não sei e ainda hoje para perceber.

“Thank you soooo much” digo eu e com vontade de abraçar. Abraço o bebé, que entretanto lá se acalmou, afinal “quem os meus filhos beija, a minha boca adoça!”. Mas acrescenta que só esperarão 15 minutos. Chegamos à gare e nova corrida. Ela pede-me o bebé e enquanto corremos as duas, aponta-me em que direcção devo correr. Volto a agradecer e continuo a correr. O motorista estava à minha espera, assim como todo o autocarro e fez-me entrar. Quando por fim a mãe e o seu lindo bebé alcançaram o local, já estava a camioneta a arrancar. Eu acenar feliz que nem uma louca, a mandar beijinhos... e assim estivemos, até nos perdermos de vista, a dizer adeus.  Eu, a mãe, o lindo bebé e Varsóvia.

 

Ler: Parte I e Parte II

Memórias de Varsóvia - parte II

02.08.16

No dia seguinte, lá vou eu com o meu mapa cool à procura do centro, que não é centro, mas que está no centro das coisas a visitar em Varsóvia. Perco-me e exaspero-me. Parece que estou numa cidade, ignorada pelos próprios habitantes. Mostro o mapa e abanam a cabeça. Pergunto e ignoram-me. Tento o inglês e ninguém me entende. Começo a duvidar sobre a existência desse mesmo centro. E a chuva que não pára.

Quando por fim pára, deparo-me com os grandes edifícios históricos e imponentes, com os seus materiais claros, e levam-me a acreditar que estou no caminho certo. Pelo meio uma exposição: “Proud Warsow”. Pequenas textos acompanham fotografias que contam a vida da cidade depois da Primeira Guerra Mundial. A arma apontada ao menino polaco por um soldado alemão também está lá. E muitas. As segregações dos passeios para judeus e não-judeus. As mulheres a cozerem as estrelas de David nas suas roupas. Depois: os guetos. A guerra e a destruição de Varsóvia: antes das bombas, após os bombardeamentos, durante a recuperação e agora. É impressionante. Varsóvia é como esses velhos casmurros, que sobrevivem a tudo e resmungam "vaso ruim não quebra". Sobreviveu para contar. E assim como uma avó que nos conta as histórias do seu tempo e das dificuldades que passou, também Varsóvia faz questão de nos mostrar que orgulhosamente sobreviveu a tudo isto.  Depois disto é impossível ficar indiferente a tudo que se vê. A cada edifício, cada passeio ou flor nos jardins. Ou até mesmo ao outro centro, o feio.

Por fim, o tão esperado centro. LINDO. Um amor. Depois da guerra, os próprios polacos o reconstruiram usando uma boa parte dos destroços causados pelos bombardeamentos. Várias pracinhas, muitas flores nos beirais e com o sol a surgir a lembrar que é Primavera, afinal. Porém, aquele centro agora tão turístico, já não é Varsóvia de hoje. É uma Varsóvia que ficou algures no tempo. E ao percebermos isto, aquele centro feio e de prédios altos já não nos parece tão feio, nem tão desprovidos de carácter. É, sim, sinal de uma nova Polónia. Uma Polónia que ainda durante a segunda guerra, se viu invadida pelo exército soviético e que mesmo após de todos os esforços de resistência contra os nazis, foi esquecida pelos Aliados, que a ofereceram de bandeja a Estaline, tendo continuado agregada pela Rússia até 1991. Aquele centro feio é a pressa de se libertar de um comunismo autoritário, severo e com muita censura, que durante anos travou a Polónia.Tudo o que podia contrariar o regime de Moscovol ali se instalou.

 

Para perceber tudo isto é essencial visitar o Museu da Guerra.

Enquanto esperava pelo Tram que não chegava, achei por bem perguntar se estava na paragem certa. Óbvio que não estava. Como tinha algumas dificuldades com o inglês, a senhora perguntou-me se falava russo ou português. “Como??? Português??? Mas eu sou portuguesa!” Grande alegria. Ela tinha vivido muitos anos em Portugal e ainda se lembrava “um bocadinho”. Contou-me que por vezes falava sozinha para não se esquecer. Levou-me até à paragem correcta e esperou pelo Tram comigo, explicando ao motorista onde eu devia sair. Enquanto isso falámos de Portugal, do sol e dos pastéis de nata. 

 

O Museu da Guerra é qualquer coisa de... esmagador. Fotos dos bombardeamentos e do Holocausto que eu nunca tinha visto e que não estava preparada para ver. Relatos impressionantes, objectos reais. E sons, muitos sons. Não pedi um guia e fiquei com pena. Fui-me colando a muitos grupos, pois parece impossível trabalhar ali e não ser também uma parte da história da cidade : “Vêem esta foto? O meu tio morreu nesse dia” ou “Esta era a casa dos meus avós” ou “O Exército Vermelho levou o meu primo e ainda hoje não sabemos o que lhe aconteceu”. A naturalidade com que contam estas histórias  é impressionante. 

 

Em Varsóvia é impossível ficar indiferente ao enorme edifício soviético que ainda hoje estão noutras capitais que viviam sob as ordens de Moscovo. O típico edifico comunista e feio. Os polacos chamam-lhe o “Bolo de Casamento de Estaline” – eu bem vos digo que estes polacos são duros.

"Vou-não-vou. Vale-a-pena-não-vale. Pago-não-pago." Acabo por ir. para logo a seguir me arrepender. Um centro cultural fraquinho, com pouco para ver ou fazer. Se bem que, a vista até é jeitosa.

 

 

*Ler: Parte I e Parte III

Memórias de Varsóvia - parte I

01.08.16

Lembro-me de chegar a Varsóvia de autocarro, vindo de Cracóvia. Pelo meia paramos, numa qualquer terriola no meio do nada, onde a estação dos autocarros mais parecia uma nave espacial. Um circulo. Com um tecto redondo. Pelo caminho, cruzes, muitas cruzes. Poucas casas. Poucas pessoas. Mas muitas cruzes.

Na estação de camionetas de Varsóvia, à falta de opção, dirigi-me ao balcão de uma qualquer companhia, que com alguns desenhos e escritos num resto de bilhete, lá me indicaram como chegar ao centro e uns quantos hotéis para ficar – sim, toda eu, sou uma pessoa que viaja ao Deus dará.

 

“To the center please?”

“No, no!” E muito polaco. Como viajante bem guiada, deixei-me levar pelo braço até ao autocarro. Ao que parecia estava do outro lado. Fui. Entrei e paguei – nesta altura já eu era entendiada na moeda polaca e como qualquer europeia com Euro, maravilhava-me com o pouco que custava tudo. Caminho, caminho. Estrada, estrada. A porta abre e eu sou gentilmente convidada a sair “centre, centre”, apontaram.

 

“Mau Maria!!” penso eu. Era tudo tão bonitinho na Internet. Os postais em Cracóvia mostravam-me um centro mágico, de histórias de encantar, muitas cores e com flores nos beirais. Onde estava o chão de pedras que resistiu à segunda guerra Mundial ou os edifícios de cores pastel? Aquelas lindas paredes em verdde, laranja, azul e amarelo, reconstruidas pelos próprios polacos? Era tudo alto. Muitos prédios. Feios. Muito KFC, MacDonalds, H&M. Senti-me enganada, mas como a culpa é sempre minha, pensei logo: “apanhei o autocarro para o lado errado”.

Na paragem volto a tentar o inglês e à falta de quem me entenda, mostro o meu bilhete com as direcções. As mãos mexem-se, esquerda, direita, em frente. Afinal, é por ali. Sigo. Lá chego, depois de perguntar umas mais 273662734 vezes onde fica.

 

Quando entro, vejo que o meu hostel tem toda a pinta de ser uma antiga casa polaca. Mais tarde descubro que foi herdada da avó e que foi transformada num hostel, pela neta e pelo namorado. A casa dá para o total de 12 pessoas. Sou bem recebida e depois de me instalar (isto é: pousar a mochila), a menina dos piercings e das rastas, a neta, mostra-me a casa - que é linda.

A grande cozinha de azulejos, com cafeteiras já queimadas pelo tempo, a casa-de-banho que exigia mil truques desde a posição para fechar a torneira ao puxar o autoclismoou os truques para mater a água quente. No grande salão, há uma cadeira de baloiço e uma grande janela. Divido-me entro os dois, mas opto pela janela. E não é que os prédios feios e gigantes continuam lá? Sento-me, enquanto bebo um chã servido pela minha nova amiga que me conta que é polaca, de Varsóvia e me conta histórias da avó falecida. Como a casa é muito grande e há pouco trabalho na Polónia, ela optou por fazer dela um casa para quem chega e para amigos. O namorado (um polaco alto e de cabelo escuro, com muitos, muitos piercings também) dá-lhe uma ajuda.

Depois, dá-me um mapa de Varsóvia alternativa. Uma alternativa aos mapas de sempre, esses oficiais, feitos para turistas e não para viajantes. Este projecto, que há em mais cidades, permite conhecer o local pela perspectiva e opinião de quem nele vive. Logo percebo, que estou no centro de Varsóvia e que o tal, o bonitinho, é “coisa para turista ver”. A vida não é bonita na Polónia, nem o centro, explica a minha amiga nova. A minha amiga explica-me que só mesmo turistas e estrangeiros andam por lá, pois os altos preços das lojas e restaurantes, assim como as elevadas rendas, fazem com que os habitantes fujam deste espaço.

 

 

*Ler: Parte I e Parte II

Viajar sozinho?

08.07.15

Cada vez são mais as pessoas que vão viajar por esse mundo fora sozinhas! Porém, viajar sozinho ainda é um bicho de sete cabeças na cabeça de muita gente! Vamos?

 

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Istambul, Turquia 

 

Ir ou não ir?

Sempre ir! A minha primeira viagem sozinha foi à Polónia. Era suposto encontrar-me com amigos, mas no último momento, não puderam ir. Depois, foi Marraquexe, porque uma amiga teve problemas com o passaporte. Mais tarde, viajei pela Tailândia e por Laos sozinha. Se nas primeiras foi por obra do acaso, a última não! Estava eu no drama vou-não-vou!-Ai-Buda-que-vou-sozinha, quando um amigo que já lá tinha estado me disse para não ser tonta e ir! E tinha razão! Ir é sempre a melhor opção!

 

 

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 Paris, França

 

Estar sozinho não é para ti?
OK, eu compreendo essa parte. Compreendo que partilhar e ter com quem falar é bom, mas a verdade é que um viajante nunca está sozinho, seja metafórica ou literalmente. Aproveita a viagem não só para conhecer outras pessoas, mas sobretudo para te conheceres melhor. É tão raro estarmos sozinhos nos dias de hoje, que nem que seja por isso, uma viagem é sempre estimulante.

 

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 Marraquexe, Marrocos

 

Como assim, vou sozinho e conheço mais gente?!
Não é frase feita, é facto! É também facto, que quando estamos acompanhados, temos tendência a fechar-nos um pouco mais. Também quem está de fora se sente menos cómodo para meter conversa, conversar ou convidar.
Claro que também depende do país - no Japão, por exemplo, não senti que fosse muito fácil socializar, mas mesmo assim aconteceu! Por vezes, até os viajantes mais solitários, têm alguma dificuldade em estar sozinhos.
E lembra-te: também tu podes meter conversa, conversar ou convidar! O não está sempre garantido e depois disso, o céu é o limite!

 

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 Bangkok, Tailândia

 

E se EU não conheço ninguém? Se comigo é diferente? E se ninguém gosta de mim? E se...!
Conheces, vais ver que sim! São cada vez mais os hostels que promovem actividades com outros viajantes. E opções de hospedagem como o AirBnb ou CoachSurfing asseguram amigos ou uma cara conhecida na hora.

 

 

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 Índia

 

Para onde ir?
O mais importante é escolher um destino onde TU TE SINTAS SEGURO! A segurança é relativa e para que nos aconteça algo só é preciso estarmos vivos, não é assim? Lembro-me que, por causa dos meus amigos Peruanos, fui para o Peru cheia de cautelas e nada aconteceu! Quando fui para a Índia, o tema das violações a mulheres (inclusive estrangeiras) era o tema do momento e mesmo ali, sempre me senti segura. O mesmo no Irão! A verdade, é que a única vez que foi assaltada, foi em Madrid!
Concordo que é importante ir-se preparado e consoante o país tomar precauções, mas mais importante é estar confiante no país que se escolhe e isso, mais do que rankings de segurança e estatísticas policiais, é uma escolha que cabe a cada um! Caso contrário, os medos e os preconceitos vão ser sempre uma barreira.

 

 

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 Budapeste, Hungria

 

Importante: estar sozinho é bom!
Essa pressão da companhia, é muitas vezes fruto da cabecinha de cada um! Ou daquilo que achamos que os outros esperam! Alguém que viaja sozinho, janta sozinho ou está na praia sozinho, não tem que ser um anti-social ou um infeliz, ok? E aprende: estar sozinho é bom!
Recordo-me que com uma amiga minha em Paris, havia coisas que fazíamos separadas, simplesmente porque tínhamos interesses diferentes - e sim, continuamos amigas e eu gosto mesmo muito dela!

 

 

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 Shiraz, Irão

 

E se me acontecesse alguma coisa?
Pois, pode acontecer e nada melhor do que ter um seguro de viagens - há-os a vários preços. Mas também ir relaxado com o tema, há sempre algum hospital e em todos os países, as pessoas ficam doentes e se curam. Contigo será igual! Umas aspirinas, um Fenistil e um Betadine são sempre bons amigos  - isso e verificar antes os cuidados a ter em cada país (vacinas, comprimidos para a malária, repelente, protector solar, etc.).

 

 

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 Perto de Luang Prabang, Laos 

 

 

Sozinho não gasto mais dinheiro?

Bem, isso é relativo! Afinal, se vais com um(a) namorado(a) também divides as despesas, assim como com amigos, não é? E, acredita, um quarto para dez pessoas sai mais barato do que um de duas pessoas. E tal como tu, há mais gente a viajar e podem sempre partilhar gastos de transporte ou até quartos. Aqui ficam umas dicas para poupares dinheiro enquanto viajas.

 

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 Cracóvia, Polónia

 

 

O meu inglês não é muito bom
Bem, tens aqui uma motivação para o melhorar! O inglês ajuda sempre, se bem que a mímica e os gestos são o melhor meio de comunicação em muitos sítios. Viajar é também uma forma de aprender idiomas, afinal, nada como ter que falar, para aprender, right?

 

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 Tóquio, Japão

 

Eu sou mulher, não é pior?
Não, nada! Primeiro, exactamente por seres mulher, que és tão capaz como qualquer homem e que ninguém te convença do contrário! E verdade seja dita, muitas vezes somos um pouco beneficiadas pelo machismo. Segue a lógica: como somos mulheres, somos mais tontas/frágeis, logo necessitamos de ajuda! Muitas vezes, o machismo expressa-se em forma de paternalismo! E pensa, só o facto de estares ali, sozinha e a viajar, já estás a mudar mentalidades! Go girl!

E sim, a vida nem sempre é boa ou fácil para uma mulher que viaja (usar lenços, evitar decotes, homens que nos passam à frente, olhares indiscretos, etc.), mas isso também nos permite conhecer mais sobre o universo feminino e respeitar (ainda mais) as mulheres por esse mundo fora! Acredita, uma mulher tem muitas vezes acesso a coisas que um homem não possui, nem que seja pela cumplicidade feminina! Senti muito isso no Irão, por exemplo.

 

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 Madrid, Espanha

 

Liberdade! Autonomia!
Sim, podes ir onde quiseres, quando quiseres! Não precisas de fazer fretes, nem esperar por ninguém! Recordo-me em Chiang Mai (Tailândia) estar à espera de umas miúdas inglesas que tinha conhecido nessa tarde, que se estavam a arranjar! Demorei meia hora para cair em mim e pensar: "Deixa-me ir mas é à minha vida!"

 

 

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 Algures no Camboja

 

O que é eu ganho em viajar sozinho?
Hora do clichés E se é cliché ,é porque tem fundo de verdade. É inevitável que não acabes a viagem com um grande sentido de confiança e de realização! Mas mais importante: é também uma viagem de auto-conhecimento, não só porque passamos mais tempo connosco e nos conhecemos melhor, mas porque diariamente nos colocamos à prova e vamos testando limites!

 

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 Praia Jumala, na Letónia

 

E sabes qual é a melhor parte?
Depois da primeira, na próxima viagem estas dúvidas desaparecem. E podes passar directamente à fase de organizar a tua viagem. Só custa começar!

A Polónia da União Europeia

03.09.14
Muzeum Powstania Warszawskiego, Varsóvia, Polónia

Mais uma manhã .
Acordar, levantar e ir à casa de banho. Um café com leite e uma torrada com manteiga. O gato sempre atrás dele. Depois de se vestir e de se pentear, procurava as chaves, a carteira e saía de casa, em direcção ao museu.
Varsóvia também estava igual a todos os outros dias de Janeiro. Cinzenta, com neve, edifícios gigantescos, com gigantes e coloridos neon's, para lembrar a todos os que ali viviam, que há muitos anos que fazem parte da União Europeia.
Saiu do tram e em poucos passos, já estava no museu a conferir os grupos daquele dia: uns alunos de uma escola polaca entre os 13 e os 15 anos, mas tarde um casal belga e depois do almoço, um grupo de polacos reformados e ainda quatro franceses. Apesar de estar há um ano a aprender francês, a visita seria em inglês. Além de inglês e polaco, ele também falava fluentemente alemão.
Há 10 anos que trabalhava como guia no Muzeum Powstania Warszawskiego. Todos os dias falava sobre os horrores da II Guerra Mundial vividos pelos polacos em Varsóvia e em toda a Polónia.

Ele acreditava ter uma missão e por isso, aos visitantes polacos sempre falava da resistência com orgulho. A fome. A pobreza. O centro de Varsóvia reconstruído pelos próprios polacos, que usaram os destroços dos bombardeamentos nesta empreitada. Sempre que ele dizia coisas como "nós"ou "resistência" ou "liberdade", ele levava a mão ao peito, fazendo um olhar solene.
Aos mais jovens, fazia sempre questão de referir a morte do seu avô nas trincheiras ou dos seus tios-avós, depois de uma bomba alemã na capital.
Aos alemães fazia questão de recordar os números. Os números dos mortos. Os números dos feridos. Os números dos presos. Ou das crianças órfãs. Falava também dos números de bombardeamentos e dos campos construídos na sua Polónia. Não culpava estes jovens cultos do sucedido, mas não podia deixar que eles se esquecessem e por isso, sempre usava a primeira pessoa do plural nas suas descrições.
Já aos franceses, ele nunca os deixava esquecer o Governo de Vichy.
E a eles, assim como os ingleses, sempre lhes lembrava como depois de colaborarem "sem descanso e dedicadamente" com os Aliados, a Polónia foi abandonada e deixada à mercê da Rússia de Estaline - mais morte, mais miséria, mais tristeza. "Não merecíamos!" sempre dizia num tom trágico.
Eram poucos os russos que passavam por ali e a esses nem valia a pena contar nada, pois jamais entenderiam a grandeza polaca, fruto de toda morte e tristeza daquele povo.

Ao final do dia, sempre saía do museu confiante de ter concluído a sua missão e que apesar de desconcertados pelo seu bom humor, os visitantes ficavam tocados pelo sofrimento polaco durante e depois da II Guerra Mundial. Era impossível não admirar a força dos polacos e a sua capacidade de se (re)erguer.
A prova disso eram os muitos olhos emocionados, que acompanhavam sem interromper os seus relatos apaixonados ou aqueles que fechavam os olhos perante fotografias cruéis ("não posso ver isto", diziam). Havia também aqueles que olhavam, como que hipnotizados pela crueza da imagem. Os mais sensíveis despediam-se com um abraço (e/ou uma generosa gorjeta).
Era bom no que fazia e sabia-o. Emocionava os corações mais duros e sussurrava à humanidade de cada um, mas sobretudo, falava-lhes dos polacos.
É verdade que podiam não se destacar na literatura ou com grandes músicos, "nem no futebol somos tão bons" gracejava ele, mas nunca na História um povo foi tão capaz de resistir como eles.

Era por isso que no final do dia, sempre saía do museu satisfeito.
Olhava para aquela construção bonita e de linhas modernas e sentia-se orgulhoso. "Nenhum outro país seria capaz de algo assim", pensava ele enquanto voltava a casa., recordando as memórias da família judia, de um dos alunos polacos ou as lágrimas da senhora belga de 50 anos. Ou dos velhos polacos daquela tarde, que buscavam rostos conhecidos nas fotos das ruas de antigamente ou dos 20 euros de gorjeta dos quatro franceses. Dinheiro, que sempre dizia não poder aceitar, mas que sempre acabava no seu bolso.

Já no seu bairro, velho e sem luz, comprava pão e leite fresco.
Em casa, acariciava o gato e colocava os velhos chinelos. Depois, ligava à TV. Em poucos minutos passaria na televisão um documentário sobre a vida secreta de Hitler, que ele não podia perder.