Amanda Knox na Netflix
Quando descobri o caso da Amanda Knox, foi algures em 2009, porque vi uma notícia sobre um dos julgamentos. Lembro-me de na altura ter ficado perplexa e toca a mergulhar no incrível mundo da Internet a absorver, a colher, a mastigar e a reler mil informações e comentários. O caso é macabro e bem sensacionalista, eu sei, mas na altura acho que mexeu muito comigo, porque no ano anterior estava eu a fazer Erasmus e no naquele momento, estava a estagiar e a fazer o papel inverso, a receber Erasmus. A ideia de que um período, tão feliz para mim, se pudesse converter num show de horrores, impactou-me verdadeiramente.
Para quem não sabe, Amanda Knox é uma norte-americana, que aos 20 anos foi fazer um intercâmbio na Itália, tipo Erasmus. Ela partilhava casa com uma estudante inglesa, Meredith Kercher. Meredith acabou morta de forma brutal e o corpo foi encontrado no quarto dela. O alarme foi dado por Amanda Knox e pelo namorado italiano, que mais tarde passaram a suspeitos de assassinato, tendo sido, inclusive considerados culpados em 2007 e tendo chegado a cumprir os primeiros anos pena. Depois de vários apelos, foram libertados, porque o tribunal considerou que as provas forenses tinham erros graves. Pelo meio, um traficante da Costa de Marfim, Rudy Guede, foi e continua preso e outro homem, que chegou a ser indevidamente acusado por Knox, que era afinal inocente. Para mais detalhes leiam AQUI, porque todo o processo é uma verdadeira telenovela.
Apesar do horror do homicídio, o que tornou o caso tão mediático era toda a atenção dada a Knox: branca, bonita e empática. Escrutinou-se ao mínimo a sua vida, inclusive as relações sexuais, o que vestia, os locais que frequentava, etc. O diário dela chegou à imprensa. Discutia-se porque sorria, porque usava maquilhagem, por isto e por aquilo. Exploraram-se e seguramente inventaram-se vários detalhes detalhes sórdidos sobre o caso, com historias de orgias, sexo louco, sadomasoquismo, drogas e o diabo a sete!
A Netflix lançou há pouco tempo, um documentário, onde alguns dos envolvidos falam o caso: um jornalista, o policia, Amanda e o, agora, ex-namorado, em separado, tecem as suas considerações sobre o caso e a contam o seu lado da historia, para a camera. Sem grandes produções ou cenários. Tudo muito cru. Os autores deram espaço a estas pessoas para falar sobre elas. O que me continua a surpreender é o pouco que se fala da vítima, de Meredith.
Tal como na altura, também no documentário da Netflix, é assustador o desinteresse que a vitima gera. Como se ela fosse um mero detalhe! O tema é sempre se Knox é ou não culpada, se é um “lobo em pele de cordeiro”, como ela diz; se é como nós. No documentário, o inspector da Policia Italiana é verdadeiramente vergonhoso. Cheio de constatações ridículas baseadas em Deus e na Igreja, que se baseia em conclusões ridículas para provar que Amanda é culpada! A sério, há um momento no documentário, que ele diz que ela é culpada, porque um homem jamais faria algo assim! Como? Talvez até seja, mas depois de ver as imagens do crime e os argumentos deste homem, fica muito, muito fácil de acreditar na inocência dela. E depois há um jornalista, que conta sem pudor, tudo o que escreveu e inventou e tudo o que fez, para conseguir manchetes de jornal. Houve momentos que, juro, senti nojo... e a certeza que fiz muito bem, em não seguir a via de jornalista.
Houve uma jovem que morreu. Pais que perderam a filha, irmãos que perderam uma irmã e, claramente, uma vida interrompida! A vida continua, mais ou menos torta, para todas estas pessoas - o namorado italiano, que ainda está em Itália, agora é tipo o Moita Flores e comenta crimes na TV Italiana. Enfim!