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Maria vai com todos

Estórias. Histórias. Pessoas. Sítios. Viagens.

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Irão: arrependimentos

25.10.16

Graças aos senhores fofinhos da Sapo, recentemente tive de ir vasculhar alguns textos antigos para escolher um para o Destaque. Acabei por escolher o meu post sobre a minha viagem ao Irão e aproveitei para relê-lo, porque, amigos, eu sou a rainha dos typos e gralhas.

 

A viagem ao Irão foi muito importante para mim. Deu-me uma perspectiva sobre a vida das mulheres, que até aí eu nunca tinha sentido antes. E digo sentir, porque (de facto) foi a primeira vez que o senti na pele. Anos antes, fiz Erasmus na Turquia. Aí, nas grandes cidades, ver mulheres de lenço e unhas de gel e mini-saia era o prato do dia. Havia muitas na universidade e conheci umas quantos directoras e presidentes. Quando perguntava sobre “e na política onde estão elas?”, a resposta era simples: muitas mulheres optam por ser mães a tempo inteiro. Justo e no seu direito. Na altura, talvez por ser demasiado cachopa, não fazia mais perguntas. Aliás, gostava desta ideia de uma Turquia moderna e aberta. Obviamente que as coisas, e a vida, não são tão simples assim. Eu sei disso agora. Da mesma forma que o sei, que em Portugal também nem tudo é o que parece, nem na Alemanha, onde vivo agora!

 

Mesmo na altura, quando fui ao Irão, quando coloquei o lenço para tapar cabelos e pescoço, dizia para mim mesma que “aqui é assim, que há que respeitar a cultura”. O lenço caiu-me 734 mil vezes, eu andava destapada durante largos minutos e o mundo não acabou. Em oposição, eu fiquei danada de ver as mulheres a terem que usar aquela porra, só porque sim e só porque lhes mandam e só para puderem sair à rua, trabalhar, ir passear os putos e ir às compras. Caso contrário, ninguém lhes daria trabalho ou tinham a Polícia Religiosa, que não é meiga, à perna.

Ainda mais, porque no Irão é comum o uso do chador, uma espécie de tenda presa à cabeça, que cai tipo a capa do Super Homem. Só um gajo, poderia achar que aquilo podia ser roupa de mulher, porque em termos práticos, aquilo vale zero.

 

O Irão foi o primeiro país, onde me senti verdadeira secundária por ser mulher. Vamos ser honestos, todos e todas nós sabemos que há discriminação: mulheres recebem menos, ocupam menos cargos de poder, etc., etc. e tal. Mas quando algo nos acontece na pele (tipo não conseguir o trabalho X ou a promoção Y) por mais que possamos saber que há uma discriminação de género, não temos ninguém a confirmar-nos que sim, sim senhora, que é por termos uma vagina que não conseguimos algo. Isso, no Irão acontecia. Havia gente que só falava com o meu homem e não comigo ou que na hora, se recusava a apertar-me a mão, entre muitas coisas mais.

 

Apesar de já ter estado na Índia, onde os casos de femicídio são o pão nosso de cada dia, além da pobreza extrema do país ou ter vivido na Letónia, onde o abuso de mulheres está no topo da Europa (quando eu lá vivia, dizia-se que havia mais prostitutas em Riga do que em Paris), o Irão marcou-me e permitiu-me uma consciência mais aguda. Porquê? Porque lá está, o vivi na pele.

 

Quando regressei do Irão, “comi” (ainda) mais informação do que nunca sobre o país e foi assim que descobri o grupo de Facebook My Stealthy FreedomO grupo não tem qualquer afiliação política ou religiosa. Limita-se a contar histórias sobre as mulheres do Irão, desencadeando algumas reacções e acções por parte das mesmas, com o apoio de alguns homens também. “Ai, disseram que não podemos anda de bicicleta? ‘Bora lá partilhar fotos, enviadas pelas seguidoras, de mulheres iranianas a andar de bicicleta. Recentemente, mulheres partilhavam fotos sem o lenço, que eram usados pelos homens (irmãos, maridos, …) e a campanha teve inclusive destaque nos media internacionais, com o Aiatolá a falar dessas iniciativas de “subversivas e fruto das influencias sem vergonha do ocidente”!

Recentemente, a campeã do mundo de xadrez recusou-se a participar no campeonato mundial, que este ano se realiza em Teerão. A razão? Porque ela, Norte-americana, não queria cobrir-se e quem não usa lenço, não pode entrar no país.

 

Ai e tal, ela “devia respeitar a cultura!”

… tal como eu fiz quando estive no país!

Se há coisa da qual eu agora me arrependo, foi de não ter sido mais corajosa no Irão. De não ter andado mais destapada, de ter prescindido de alguma da minha roupa de todos os dias, de não ter optado por usar os lenços mais coloridos, que acabaram no fundo da mochila. Fui para o Irão com essa cegueira e ignorância, do “respeitar a cultura”, quando o chador, o lenço, o hijab, os códigos de conduta do vestuário, não foram nunca parte da cultura iraniana - basta ver fotos do Irão nos anos 80 (mais abaixo)! Sei que sem o lenço não poderia ter viajado por lá, mas hoje sinto-me um pouco envergonhada por ter usado algo que não faz parte de mim, só para ter ido lá. Obviamente, que se eu não fosse ao Irão, nada iria mudar! Afinal quem sou eu? Que protagonista tenho? Todavia, sempre que repenso nesta viagem, penso porque razão, eu que desde sempre fui apelida de coisas como “reguila” ou “respondona”, me calei tantas vezes neste país? Evitei confrontos, engoli em seco e encolhi os ombros. Raios, queria poder voltar, só para refazer tudo de novo!

 

 

 

 

 

Mais fotos AQUI.

7 Mitos sobre viagens

26.09.16

1. Fico em Portugal, porque lá fora é tudo mais caro

Esta ideia de que Portugal é barato é um mito e tem que morrer e JÁ! Lisboa, por exemplo, já está ao preço (de supermercado e de hostel) de Paris ou Londres. O Porto está a caminho e se pensarmos que na maioria das localidades não existem opções de hostel, então, viajar em Portugal não é assim tão barato.

Ainda este Agosto, fiz férias na Costa Alentejana e paguei mais aqui numa noite, do que na minha viagem ao Japão, por exemplo. Reservar o alojamento com antecedência ajuda (muito) a quem viaja com orçamento reduzido.

 

 

2. Viajar é caro

Obviamente que o conceito de caro e barato varia de pessoa para pessoa. Mas será mesmo caro? Há muitos países bem mais baratos do que Portugal - Tailândia, Marrocos, Indonésia (só para dar alguns exemplos de países bem turísticos e a bom preço) e hoje em dia com a loucura dos voos baratos é bem, bem fácil encontrar voos a preços bem económicos. E se falarmos dentro da Europa, hoje em dia sai mais barato apanhar um voo Lisboa Londres, do que ir de Lisboa a Beja.

 

 

3. O alojamento é caro

Acredito que sim, acredito que possa ser. A questão aqui é: quanto queres gastar? E depois pensar: como posso fazer para gastar menos? Precisas menos de um hotel XPTO e de um buffet com kilos de comida?

Opta pelo Coach Surfing, uma forma gratuita e simpática de arranjar hospedagem. Ficas em casa de locais, conheces mais da loucura local e ainda fazes amigos. Eu até no Irão fiz coach surfing e fui bem, bem feliz.

 

 

4. Isso de organizar viagens não é para mim

Vamos ser honestos: agências de viagens são caras e faz todo o sentido que assim o seja. Estamos a pagar a profissionais para que nos orientem a vida: do autocarro shuttle, ao hotel; sem esquecer da comida e de um guia. Entendo perfeitamente o bom das comodidades de viajar assim; no entanto, além do preço, há coisas que se perdem! Que coisas? O espirito de aventura. A capacidade de seres TU a organizar a tua viagem, definindo os teus tempos - é tão bom, estar num sítio onde somos felizes e dizer “que se dane, fico mais uns dias!”.

Hoje em dia há tantas ferramentas online para organizar viagens: o Trip Advisor, o SkyScanner, o Booking, que fica tudo mais facilitado.

 

 

5. Não tenho companhia

Entendo, mas (e eu acredito mesmo nisso) é bom que comeces a gostar de estar contigo! Carradas de gente vai entrar e sair na tua vida, mas tu serás a única constante na tua vida… brega? Um pouco! Mas é um facto.

Além disso, de viagem nunca estamos sós. Há sempre quem meta conversa, há outros viajantes e há em nós o maior disponibilidade para falar e contactar com os outros. Hoje em dia existem também mim fóruns online e grupos de Facebook sobre viagens, onde facilmente encontras companhia. Deixa os medos e os macaquinhos no sótão e VAI! Viajar sozinho é bom!

 

 

6. Só tenho férias quando tudo é mais caro, ou seja, Agosto

Sim, na Europa, Agosto é o mês das férias, logo, o mês mais caro. Mas não no resto do mundo ;) No Brasil, por exemplo, é Inverno. E há países onde nem existem as quatro estações, ou seja, há muito para explorar.

 

 

7. Tenho filhos, viajar com putos é um inferno

Eu, sem filhos, arrisco-me aqui a levar uma tareia dos pais e mães deste mundo. No entanto, não me parece que as crianças sejam uma razão para não ir. Pelo contrários. Vejamos. Os putos adaptam-se super bem às mais variadas situações. Mesmo no Camboja há hospitais e crianças que ficam doentes. Relativamente, àquele argumento do “ai a criancinha não se vai lembrar de nada” a minha resposta é sempre: “E?”. Os pais não contam? As memórias de família?

Há cada vez mais casais a viajarem com crianças, mesmo na Índia onde há problemas com água, era comum ver casais de viajantes com os miúdos atrás. Entendo que tem de haver uma maior logística, mas sim, pode-se e deve-se fazer. As crianças agradecem.

 

 

8. Não tenho dinheiro. Viajar é um luxo e coisa de rico

Seja, porque não se tem trabalho ou se recebe pouco, é normal que viajar não seja sempre uma prioridade. Todavia, muitas vezes, custa-me ouvir pessoas dizer que querem muito fazê-lo, mas não podem, por falta de dinheiro. No final do dia, é tudo uma questão de prioridades e ter objectivos bem definidos - aqui ficam umas dicas para poupar para viajar e também sobre como poupar durante as viagens.. Acreditem, eu, infelizmente, estou tão, mas tão longe de ser rica! 

Teste: És privilegiado(a)?

20.06.16

O Buzzfeed Espanha criou este teste espectacular, para medir o grau de privilégio de cada um.

A maior utilidade do teste é pôr-nos a todos a pensar em situações de discriminação que ocorrem diariamente: já alguma vez fui discriminada por ser mulher? Será que a minha religião influencia sobre o que os outros pensam de mim? Devido à minha raça tenho menos opções de trabalho? Alguma vez menti sobre a minha orientação sexual para ser aceite ou evitar problemas? Lido bem com o meu corpo? Aceito a minha personalidade?

Mais do que reflectir sobre possíveis preconceitos, entre outros aspectos da personalidade de cada um, o teste obriga-nos a "pôr-nos nos sapatos dos outros" e a pensar "ah pois, isto acontece" ou "pois, deve ser lixado".

Fiz o meu teste, cujo resultado foi:

 

"¡Tu marcaste 56 de 88 en esta lista!
Tienes bastantes privilegios. Has tenido algún que otro obstáculo en tu vida pero en general ha sido todo bastante fácil. No es malo, tampoco es algo de lo que debas sentirte avergonzados. Pero deberías ser consciente de tus ventajas y trabajar para ayudar a otros que no las tienen. Gracias por comprobar tus privilegios."

 

Nada que eu não soubesse! Eu sou branca e não me venham cá com a história do "não há racismo (em Portugal/na Europa/no mundo", porque só quem não tem amigos negros pode fazer esse tipo de comentários. Mais, sou privilegiada porque tive a sorte de nascer numa família, que mesmo não sendo rica, me possibilitou várias oportunidades, como ir à escola, fazer universidade e até estudar fora do país. E, o que também ajuda muito, sou heterossexual, ou seja, o única armário sempre esteve sem monstros ou fantasmas, nem dúvidas existenciais.


Acho que só não consegui mais pontos, porque me revi em algumas situações de machismo. Muitas, de forma mais extremada ocorreram na minha viagem ao Irão. Siiiiiiiiim, eu sei que há muito machismo em Portugal e no meu prédio de certeza que também. Eu sei que o machismo fere e mata diariamente, mas lá está, eu sou uma privilegiada. Antes sempre que algo acontecia, eu não avaliava a situação, em função do meu género. Pensava apenas "é estúpido!" e seguia caminho, não era tão consciente dessa diferença de género, nem tão sensível ao tema. Cresci. Hoje, mesmo sendo privilegiada, sou mulher e trabalhadora, sei bem o que é ver homens a ganharem mais do que eu e de como é difícil ser levada a sério ou chegar aos 30 e avançar na carreira, porque (já se sabe) podemos parir a qualquer momento!

 

E tu, quanto é que tiveste no teste? Podes fazê-lo AQUI.