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Maria vai com todos

Estórias. Histórias. Pessoas. Sítios. Viagens.

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Lições a tirar da vitória de Bolsonaro no Brasil

29.10.18

De André Carrilho

De André Carrilho 

 

Bolsonaro ganhou no Brasil e é agora o presidente do país. Se cumprir o que prometeu, preparem-se para:

  • Armas para todos
  • Redução da idade penal (a ideia é que aos 16 anos já se possa ir preso)
  • Uma polícia que entra para matar
  • Um discurso de ódio contra negros, gays e pobres. Haverá medidas nesse sentido? Há que esperar para ver! Para já, começaram as porradas na rua, em nome do presidente

 

Ao contrário de Trump, Bolsonaro é fascista, sim - e convém separar os dois. No entanto, podemos juntar os dois para tentar perceber como é que alguém assim, como estes dois, conseguem em plena democracia, conquistar votos e ganhar eleições? É certo que já todos vimos discursos de ódio a ganhar antes. É também por isso,que há umas quantas coisitas que deveríamos aprender todos com a vitória de Bolsonaro no Brasil, até para evitar acontecimentos similares.

 

Políticos mais transparentes/Combate à corrupção

Até onde os brasileiros que votaram realmente apoiam Bolsonaro ou simplesmente odeiam mais o PT, nunca vamos realmente saber. A verdade é que depois de três mandatos com um governo de esquerda, o Brasil passou para a extrema... direita!

Isso deveria obrigar TODOS os políticos em TODOS os países a repensar o seu status e papel na vida dos cidadãos. Não dá para continuarem a achar que são superiores ou intocáveis. Nunca se soube tanto como hoje e, no entanto, a impunidade anda (ou continua) à solta - no Brasil, como em Portugal e tantos outros países. As pessoas estão fartas e os Bolsonaros desta vida são uma resposta fácil - sim, até mesmo quando eles fazem há mais de 20 anos parte do sistema!

 

A falta de soluções

O Brasil é um dos países do mundo, onde mais gente morre assassinada. Isto, é um facto. Bolsonaro disse que ia armar todos e matar os bandidos - seja lá isso o que for. O que fez a oposição? Chamou o Bolsonaro de fascista e criticou a sua sugestão - e bem. Contudo, isso só não basta. Faltam as ideias, as propostas, as medidas.

Não basta dizer aos votantes do Trump que construir um muro é ridículo. Importa, mostrar-lhes como a força dos emigrantes é essencial para a economia americana e como há mais brancos a cometer actos terroristas no país, do que muçulmanos.

A política está pobre de ideias e de debates com soluções. 

 

A passividade do eleitorado

Continuamos sem votar, sem querer saber. Política não é problema nosso, porque já se sabe "os políticos são todos os iguais", são todos "gente da mesma laia" e farinha do mesmo saco. Se calhar está na hora, de reAGIRMOS também, não?

 

Antiturismo ou "Como assim contra os turistas?"

22.10.18

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Estou de momento em Hanói, na capital do Vietname. Cidade louca, cheia de motas e buzineladelas, onde uma pessoa não atravessa a rua: aqui, uma pessoa atira-se! Hanoi é uma cidade vibrante e louca, cheia de restaurantes, cujas cozinhas se montam nos passeios e as melhores comidas são feitas em bancos de plásticos, com paredes esburacadas e sem cor. Adoro.

No outro dia, fui fazer uma tour de comida em Hanoi e quase que parecia uma anedota, com a guia vietnamita à mesa com uma portuguesa, um italiano e uma espanhola - ele perto de Veneza, ela de Barcelona. Falamos de muita coisa e, claro, falamos também do turismo.

Como acontece em todo o mundo, o turismo em Hanoi também tem crescido muito nos últimos anos e com isso, também as rendas aumentaram. Explicámos à guia, que nas nossas cidades/países era cada vez comum havver movimentos anti-turismo, inclusive com gente a grafitir paredes com "fora do turistas", a espalhar cartazes com " turistas não" e a preparar manifestações.

Ela ficou chocada.

Para ela, o turismo significa dinheiro e logo, a melhor forma de melhorar a vida dela.

Além disso, dizia ela "que culpa têm os turistas?".

 

Já aqui falei disso, que a culpa não são os turistas, a culpa é da gestão e no outro dia, caiu-me o rabinho quando vi num post de Facebook, num grupo de viagens, uma pessoa a pedir dicas sobre Lisboa e gente a responder-lhe coisas como:

  • "Não vás, por causa dos turistas, os portugueses não têm dinheiro para pagar as rendas"
  • "Por culpa de pessoas como tu, os salários dos portugueses estão baixos"
  • "Eu vivo aqui e por favor, não venhas. Somos muito hospitaleiros, mas a situação do meu país está insustentável

... e outras pérolas mais! A sério, pessoas?

Eu sou toda a favor do turismo sustentável. Defendo os valores do turismo local e até com certas regras, mas esse tipo de apelos é ridículo. Os turistas não têm culpa, eles nem votam no país que visitam. Eles não têm poder de decisão. Esses vossos apelos e energias devem e têm de ser canalizados noutras direcções, neste caso para a classe política e para o patronato.

Quando temos negócios a crescer e patrões que continuam a abusar de recibos verdes ou a pagar em negro, assim como gente que continua a receber o salário mínimo ou o mesmo ordenado de há 5 anos, é aí que temos de atacar.

E nos alojamentos ilegais.

E em plataforrmas como AirBnb e Uber que descartam as suas responsabilidades e pagamentos de impostos em pleno e nos países onde estão.

E... em muitas outras coisas mais! Porque, sim, o problema do turismo em Portugal é a gestão, mas também é a ganância.

Crescemos e ficamos medricas

16.10.18

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No domingo à tarde, lá ia eu feliz da vida a pedelar pela província de Ninh Bình (Vietname) afora, quando cheguei a uma senhora descida. Desci, cableo ao vento e sempre com mãos nos travões - que, verdade seja dita ,não funcionavam grande coisa.

Caramba, era eu miúda quando literalmente me mandava de bicileta por descidas bem piores do que aquela, sem mãos nos travões e, por vezes, sem mãos no guiador. Uma pessoa cresce e tudo muda: ficamos beeeem medricas! Na altura, o meu único medo era que a minha mãe me apanhasse a descer a ladeira vertiginosa ao lado de minha casa.

Acho que ainda hoje a posso ouvir aos gritos: "tira a saia e põe uns calções. Olha que a saia fica presa nas rodas da bicileta" - e um dia ficou. E, claro,  eu caí como gente grande. 

Eu fui uma criança que caiu muito. Na verdade, mesmo agora, adulta, caio muito - pelo menos, acredito eu, caio mais do que é suposto uma pessoa na casa dos trinta cair. Talvez por isso, também esteja mais medricas, porque sei que doi. Aleija. 

 

Manual para os amigos com filhos

11.10.18

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É cheguei àquela fase em que está tudo prenho ou com bebés. O meu Whatsapp foi invadido por barrigões e muitas fotos e vídeos de putos, com mais ou menos graça. É o que temos amigos! A pensar nisso e como quero manter muito as minhas amizades, aqui fica um guia para as minhas amigas e amigos com filhos. Cumprindo isto e a amizade eterna está assegurada.

 

1. Não dirás a idade dos teus filhos em meses

Putos com 26 meses têm 2 anos! Não me façam fazer contas, amigos. Guardem-nas para o pediatra, a única pessoa que realmente entende a diferença entre um puto de 23 e outro de 24 meses. Entende e interessa-se - é pago para isso!

 

2. Não falareis no plural

Os filhos são vossos, mas não não uma extensão vossa, ok? Evitem, por favor, o "hoje comemos a papinha toda" ou o "hoje fizemos um cocozinho lindo". A criança fez: vocês limparam!

 

3. E a propósito: não esmiuçarás o cocó

Obviamente que fazer um bom cocó é importante. Seja com 3 meses ou com 93 anos. Todos gostamos de um bom cocó. Contudo, gostar de um bom cocó, não significa querer saber detalhes sobre ele (cor, consistência, frequência,...) - ainda mais quando ele sai do rabiosque de outro ser humano.

 

4. Tendes direito a dizer uma vez por mês "o meu filho é muito desenvolvido"

Escutando pais e mães, maravilha-me saber que a geração futura está cheia de grandes génios. Seres de grande inteligência e cheios de capacidade. A humanidade está safa, os meus medos foram acalmados. Não há pai que não tenha a criancinha mais esperta, mais simpática, mais fofa, mais engraçada, mais cuxi-cuxi, mais tudo e tudo! Claro que isso só é possível com pais tão maravilhosos e cheios de talento como vocês. Sim, sabemos que têm mérito, mas a humildade é uma coisa bonita também! E para que não digam que eu não sou uma boa alma, deixo-vos, uma vez por mês, falar como o vosso mais que tudo é melhor que os outros putos ranhosos todos!

 

5. Não criticareis as educações alheias

E quem diz educação, diz métodos, filosofias ou conceitos de parentalidade, ok? Para mim, o mundo divide-se entre putos bem e mal-educados. Aquilo que cada pai/mãe faz para conseguir cada um dos propósitos não me interessa. E, para evitar problemas, eu sei, amigos, eu sei: sei que o vosso método é o melhor! Sei que sois os melhores pais do pedaço. Leram muito. Aprofundaram muito. Deram forte nos workshops e não perdem uma palestra! Viva a (tua) parentalidade! E quem está contra ela, cuspo neles!

 

Para já é isto, amigos! Todavia, revogo-me o direito de acrescentar itens a esta lista, ok?

Vamos fazer de conta de que não foi com o Cristiano Ronaldo?

08.10.18

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Mais do que o caso em si, os comentários que vou lendo e ouvindo à alegada violação de Cristiano Ronaldo é o que mais me te consumido os nervos. Será que alguém leu a reportagem do Der Spiegel? Será que se não fosse Cristiano Ronaldo e se fosse o Zé Tó ou Trump, que os comentários seriam os mesmos? Cristiano Ronaldo é dos nossos, talvez o melhor dos nossos e parece que em muitos dos seus defensores há uma dona Dolores em potência! Não importa a idade ou genero, nem classe social ou instrução. As marcas do machismo estão aí!

 

Vamos começar pela parte em que o Der Spiegel expõe, e de uma forma bastante sustentada, recorrendo a provas e a indícios fortes, o que aconteceu em 2010. 

Cristiano Ronaldo e uma moça envolvem-se e a coisa termina muito mal, com ele (sempre alegadamente) a cometer uma violação anal. Sabemos que tudo isto é verdade, porque ela fez queixa à polícia e há indícios médicos que o provam. E há aqui que entender umas quantas coisas, válidas para este caso e para outro qualquer.

Mesmo que ela seja a mais puta das putas, a mais badalhoca das más pessoas e megeras oportunistas ressabiadas, nada, NADA justifica uma violação. Nem a torna impune.

"Ai e tal ela foi com ele, sabia ao que ia!" Oi? Sabia? Vamos imaginar que ela é a rainha das prostitutas badalhocas ou o amor da vida toda. É válido, neste e noutro caso, que a meia da penetração ela/ele diga não. Seja porque mudou de ideias, seja porque está a doer ou porque tem a panela ao lume. Se depois disso o o outro (ou outra) continua e força, significa violação. Abuso. E isso é crime. Um crime horrível.

 

E é aqui que o caso de CR sai fragilizado, pois os documentos apresentados pelo Der Spiegel demonstram que ele terá dito que ela disse não e para parar.

 

Quanto ao acordo, primeiro há que entender que os acordos extrajudiciais são bastante comuns nos EUA. A ideia é permitir que o nome das vítimas seja mantido em segredo e evitar, assim, o estigma. 

Além disso, como as leis para crimes sexuais ainda deixam muito a desejar, muitos advogados de defesa optam por este caminho como forma de assegurar alguma justiça - mesmo que seja apenas financeira. Sim, financeira. Receber dinheiro. Pasta. Cacau. Não sei se andam distraídos, mas em muitos crimes, também em Portugal, é comum existir a compensação monetária. Seja pelos danos feitos ao carro, seja quando morre um filhos por negligência médica.

E juntem a isso, o poupar a vítima a uma tremenda exposição e a um julgamento sem fim. Imaginem-se, só por três segundos, ser violados e depois sentados em tribunal a contar a para todos a história que tanto querem esquecer. Pior ainda, imaginem que o vosso abusador é um homem que ultrapassa o conhecido, é idolatrado. Acham que tinham coragem de passar por tudo isso? De dizer quem ele é?

 

O Der Spiegel refere esta parte, mostrando que durante todo o processo a vítima foi sempre aconselhada a não avançar, por ser ele quem era. Também por isso, ela nunca quis dar o nome do agressor, nem quando fez a primeira queixa - razão pela qual na altura a polícia não pode dar seguimento à investigação. E esta parte não é um detalhe, pois os próprios advogados de Cristiano Ronaldo deixaram bem claro no acordo, que nem ao terapeuta, ela poderia indicar quem era o agressor. E ela não falou.

 

O caso veio agora à tona com a investigação do Der Spiegel, que já no ano passado fez desta história notícia, mas claro ninguém acreditou. Ainda mais, porque não havia vítima. Não havia um nome - sim, ela recusou-se a falar.

 

  • "Porquê falar agora?"

Eu acredito que há várias razões. A primeira foi ver que o Der Spiegel não ia desistir facilmente - inclusive, apareceu uma jornalista à porta de casa dela. Depois, porque (por fim!) esta mulher obteve ajuda legal competente, que tem revelado as várias falhas do acordo feito em 2010, inclusive o desprezo que a defesa nutriu por ela, enquanto vítima. E também porque, acredito eu, sente uma necessidade de contar a sua história, fazer ouvir a sua voz. O ambiente é também favorável, afinal o #metoo veio dar voz a muitas vítimas, homens e mulheres, de abuso que anos depois, conseguem agora libertar-se e dar os seus testemunhos.

E se estão atentos, ela deu uma entrevista e desapareceu. 

 

Novamente, não me compete a mim julgar, nem a ninguém, mas pensem. O que tenho lido e ouvido, o preconceito e o machismo, dão medo. Muito medo! E volto à questão acima, será que se não fosse o protagonista da história Cristiano Ronaldo, seriam estas as reacções?