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Maria vai com todos

Estórias. Histórias. Pessoas. Sítios. Viagens.

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A primeira e última vez que fui a Roma

14.01.16

 

A primeira e última vez que fui a Roma, não havia Ryanair. Não se falava em low cost ou voos baratos. O voo para Roma custou cerca de 150 euros e tive de o comprar através de uma agência de viagens. Não havia voos directos. para chegar a Roma, fiz escala em Madrid. Caramba, como as coisas mudaram! Fui com um amigo e foi uma luta, para decidir quem ia à janela do avião. Foi a primeira vez que andei de avião A minha primeira e última viagem a Roma, há mais de dez anos atrás, está cheia de "primeiros"!

Na altura não havia hostels, também não fez falta, pois fiquei com amigos. Não havia Facebook ou Instagram. Tirava-se fotos com a câmara digital e em vez de selfies, pedíamos a quem passasse para nos tirar uma fotografia. Mentira, tirámos vários selfies, só não lhes dávamos esse nome e são tão aparvalhados, que ficaram bem guardados. Nunca me passou pela cabeça, que mais tarde seria cool partilhar com meio mundo todo esse tipo de coisas!
Nessa altura, em Itália eram as eleições (polémicas) entre Burlosconi e Prodi. Recordo-me de no Termini existir um enorme cartaz de Berlusconi, que dizia qualquer coisa como "Emigrantes ilegais à vontade? Não, obrigado". Isto chocou-me, como era possível um político passar uma mensagem daquelas?
Lembro-me também que em Florença só havia cartazes de Prodi e em Nápoles, nem de um, nem de outro. A mensagem era mais na linha de "orgulho napolitano". Mas avante, porque este texto é sobre Roma.
Foi em Roma que eu me deparei pela primeira vez com a questão da emigração ilegal. Impressionou-me a quantidade de negros que havia pelas ruas a a vender carteiras de Pradas falsas ou DVD's ou os muitos emigrantes do leste com cartazes a pedir dinheiro para os seus oito e mais filhos, todos eles cheios de doenças. Que mundo aquele! Recordo-me sempre de na Via Condotti (a rua mais cara de Roma, cheia de Channel, Gucci e lojas onde eu nem me atrevia a entrar, com medo dos seguranças - homens grandes e armados), a polícia chegar e levar uma senhora com um cartaz ao peito, que estava simplesmente sentada à porta da Cartier. Roma impactou-me muito por isso. Foi a primeira vez que abri os olhos e a consciência para estes temas das desigualdades sociais. Havia um locutório perto do Termini, de onde telefonava à minha mãe, pois não havia cá Internet no telemóvel. Um dos senhores que lá trabalhava era um Indiano com um PHD em Física? Como era possível? Sim, sim, eu sei. Aliás, agora eu sei, mas na altura acreditava que bastava trabalhar muito e ser competente para se conseguir algo. Eu ainda não sabia de como as igualdades de oportunidade são um luta diária. Ele dizia-me "aqui, não querem saber de nós. Vês uma parede? É isso que os estrangeiros como eu são aqui. Os italianos veem-nos, sabem que estamos lá e evitam-nos. É a mesma coisa!"
Recordo-me de ir ao Vaticano e esperar aquela "coisa mística", que todos dizem sentir, "nem os não Cristão ficam indiferentes", disseram-me em Portugal. Sinceramente, não senti nada. Aliás, muita da repulsa que sinto por toda a instituição cristã, vem certamente desta altura. Recordo-me de ver filas de gente a comprar dvd's pirateados e Pradas falsas e, do nada, uns assobios de aviso, que se iam escutando cada vez mais próximos de onde eu estava. Toca a meter tudo nas sacolas e alaaaaaaaaaaaa, os vendedores (obviamente negros e, sei-o agora, ilegais) a correrem dali para fora! Do Vaticano lembro-me também das muitas pessoas que estendiam a mão nas ruas. Eram mesmo tantas. Se calhar, agora, seria algo normal; mas há dez anos atrás, para mim e com Portugal, aliás Coimbra, para comparar eram muitas as pessoas que eu via na rua a mendigar e ao frio. E depois, era ver padres, freiras, frades e beatos a passarem por eles, sem parar, sem olhar, sem sorrir.
A melhor recordação que trouxe do Vaticano foi a da Capela Sistina, a abarrotar de italianos, que fotografavam sem dó, nem piedade, e muitos flashes o tecto de Miguel Ângelo, ignorando, assim, os muitos avisos que estavam por todo o lado. Isso e a múmia do Museu do Vaticano. Caramba, uma múmia a sério e em exposição. Um morto! Lembrem-se que a primeira e última vez que fui a Roma foi um coleccionar de primeiras vezes para mim!
Lembro-me de ficar fascinada com as mulheres em Roma, todas se cuidavam de alguma forma. Mesmo as mais descuidadas, possuíam vestígios de um cabelo outrora pintada ou de um verniz, mesmo que já gasto. Havia cuidado. Já os homens, todos armados em sedutores e demasiado Cristiano Ronaldo style na minha opinião. Ele era brincos, ele era correntes ao pescoço, ele eram cruzes! Xiça!
E o Coliseu, caramba, o Coliseu! Este fim-de-semana quero lá voltar. Não conseguia deixar de pensar que passados tantos séculos aquilo ainda ali estava, ainda era real. Os gladiadores tinham sido reais. Que local! A par do Taj Mahal e de Machu Picchu, o Coliseu foi sem dúvida um dos locais mais impressionantes que visitei.
Caramba, amanhã vou estar em Roma. Estive lá há mais de dez anos. O mundo mudou tanto. E Roma? E eu?

Resposta ao Senhor Arrumadinho sobre a Panna Cotta com Nutella

12.01.16

Senhor Arrumadinho,

 

já cheguei tarde ao seu texto, mas não pude deixar de lhe responder. É que este seu texto reflecte uma parte, infinitamente divertida, da minha relação e questões domésticas.

 

"Por achar esta combinação perfeita, sempre que vou a um italiano faço o mesmo filme. Chega a hora da sobremesa e lá faço as três perguntas: 1) Tem Nutella? (invariavelmente a resposta é "sim"); 2) Tem panna cotta? (invariavelmente a resposta é "sim"); 3. Então queria saber se é possível trazer uma panna cotta mas sem molho e só com Nutella por cima (invariavelmente a resposta é "vou perguntar a ver se é possível)."

 

Quando cheguei a esta parte, dei por mim a rir e muito. Imaginei logo o Chef do dito restaurante, obviamente um senhor Italiano na minha cabeça, a levar a mão ao peito e a fazer uma cara de escandalizado e dor, muita dor!

Passo-lhe a explicar - e quem sabe consiga explicar também a recusa dos vários restaurantes.
Vivo e namoro com um Italiano e ele, assim como a maioria (ou todos!) os meus amigos Italianos têm uma relação dogmática com a gastronomia do seu país. Algo, que admito, me diverte muito, muito, muito!
Para que tenha uma ideia, ainda ontem, enquanto me ria por dentro, comentava este texto lá em casa. Vi logo o sobrolho do meu namorado em guarda, assim que ouviu "Lisboa" e "restaurante italiano". E quando ouviu as palavras "panna cotta" e "Nutella" na mesma frase, o pobre do sobrolho, gritava!

Desde que vivemos juntos que só como massa Barilla. Aquelas massas de marca branca o não italianas foram completamente banidas.
Se as instruções dizem oito minutos de cozedura, então são oito minutos. Se diz onze, seja, onze minutos. Porquê? É assim. Cada massa tem as suas características. Está na caixa e há regras.
Nada de água fria ou azeite. Massa feita, massa no prato e comer!
No início da nossa relação, quando íamos às compras, ele ia sempre confirmar se tinha comprado polpa de tomate e não tomate frito. E queijo na massa só parmesão - e dos bons.
Adoro risotto e quando uma amiga Napolitana me ensinou a fazê-lo, tornou-se no meu prato de eleição para as visitas. Todos gostavam e falavam bem. Pouco depois de começarmos a sair, eu (toda exibida) fiz-lhe um risotto. Durante a preparação, viu que eu não usava qualquer ingrediente, pois, temos pena, mas aquilo já não era risotto. Oi? Como não? Foi uma italiana que me ensinou e tudo! Mas não, ou eu estava a fazer mal ou aquilo era outra coisa, uma coisa de Nápoles, mas risotto não era aquilo, pois faltava X.
Vivemos dois anos em Madrid e nesses dois anos, apenas íamos a dois restaurantes italianos. O critério? Se faziam a "carbonara" com ovo ou com natas.
A pizza também não se divide. Cada um come a sua!
Sempre que cozinho, digo-lhe vou fazer massa com X, Y e Z. Nem me atrevo a dizer que é o prato A ou B, porque Deus Nosso Senhor das Massas me ajude, se não coloco um ingrediente ou faço alguma coisa diferente da receita original. Obvio que come, óbvio que é bom (não me safo nada mal, verdade seja dita), mas já não seria a receita A. Seria outra coisa.
Outra lição importante é: para cada prato um tipo de massa. Ragú, vulgo bolonhesa, com esparguete não faz sentido. Este ponto, admito, ainda não apanhei muito bem!
Quando a minha mãe nos visita, está proibidíssima de fazer massa.

Eu compreendo perfeitamente o que o Arrumadinho diz! É o que digo muitas vezes ao "meu" italiano. Se eu quero e eu posso (e se sou cliente), por que raio é que não posso? Se eu quero colocar queijo na minha massa com gambas, eu ponho. É minha! E lá vem a resposta, "isso não se faz!"
O mais divertido é quando tenta fazer paralelismos semelhantes com a comida Portuguesa. "È como se em Portugal,..." Nós? As almas com mais de 365 pratos de bacalhau?

Para um italiano ou alguém que siga a escola Italiana, colocar Nutella na Panna cotta é violar a receita. Com Nutella, já não seria Panna cotta. Veja, nem mesmo os grandes chefes da gastronomia Italiana da actualidade se atrevem a tocar nas receitas da "mamma"! Podem criar novas, inovar na forma de as apresentar, apostaram em ingredientes de maior qualidade, etc. Porém, nenhum altera a receita original. E se o faz, o nome muda. É criar algo novo. 
Na minha opinião, a gastronomia Italiana é das mais regradas do mundo. Há até convenções sobre quando se pode ou não beber um capuccino - tente em Itália pedir um depois da refeição. Até lho podem trazer, mas de certeza que antes o Santinho dos Cappuccinos caiu do altar!

Da minha parte, acho que a Panna cotta com Nutella tem bastante potencial, registe já a patente e a receita, antes que chegue um Italiano, lhe dê um outro nome e lhe roube a ideia